Fique em casa. O primeiro trimestre de 2020 mal acabou, mas essa já se consolidou como a frase mais dita do ano. A pandemia de coronavírus ocasionou uma globalização forçada do home office e colocou empresas inteiras – do atendimento ao CEO – em quarentena.
Para muitos gestores, esse cenário acende um sinal vermelho: nem toda companhia consegue operar desta forma. Para outros tantos, atuar remotamente, embora desafiador, já não é um obstáculo intransponível. O home office é apenas um dos aspectos de uma tendência à flexibilização do trabalho, que já não é mais vista com maus olhos por tanta gente.
Pelo contrário. Uma pesquisa da Qualtricks, nos Estados Unidos, identificou que 75% dos millennials trocariam salários maiores por horários flexíveis, dado que é respaldado por inúmeros outros levantamentos no mundo todo. Assim, essa característica se transforma numa maneira não só de garantir mais satisfação aos funcionários, mas também uma estratégia de atração de novos talentos.
Em um universo onde o tempo perdido no trânsito na hora do rush vale ouro e buscar os filhos na escola se tornou artigo de luxo, afrouxar os laços daquele velho expediente das 9h às 18h e permitir que seus colaboradores organizem suas próprias rotinas de trabalho é mais do que uma tendência, mas quase uma necessidade.
É evidente que flexibilizar a jornada num sentido estrito não é possível para todos os segmentos. Uma montadora automotiva não pode colocar sua linha de produção para trabalhar remotamente. Mas isso não significa que não possa reorganizar a rotina de trabalho dos seus funcionários para garantir uma jornada que os favoreça de alguma forma.
De acordo com levantamento da Global Workplace Analytics, em cinco anos, o número de empresas norte-americanas que oferecem a possibilidade de realizarem o teletrabalho aumentou em 40%. Mas apenas 7% delas disponibiliza essa opção para todos ou a maioria dos empregados. A questão central é: como descomplicar a flexibilização?
Novos paradigmas
Para cada segmento ou organização, flexibilizar pode vir sob roupagens diferentes. Os dois primeiros pilares sobre os quais essa ideia se sustenta são o horário e o local de trabalho.
Em alguns dias pré-definidos, oferecer aos colaboradores a possibilidade de atuar remotamente, reunindo a equipe no mesmo espaço físico no restante da semana, é uma das configurações possíveis. Mas também há outras: desempenhar parte das tarefas do dia em casa, outra parte no escritório; alterar os horários, começando a jornada mais cedo, para terminar também mais cedo e escapar do congestionamento; construir um contrato em torno de demandas e entregas, não em torno de horários; são algumas alternativas.
A Dell, por exemplo, tem um programa que oferece aos funcionários a possibilidade de optar por home office, horários flexíveis, job sharing, meio período e até mesmo semanas comprimidas, para que o colaborador trabalhe algumas horas a mais, mas faça menos dias de expediente por semana.
Com inovações possibilitadas por avanços tecnológicos como o ponto eletrônico, os sistemas de acesso remoto, o compartilhamento de arquivos na nuvem e uma infinidade de recursos para a realização de calls e meetings online, diversos processos podem ser até mesmo otimizados durante a implementação de uma jornada mais flexível. Como dizem alguns memes que circulam na web atualmente, se há uma lição trazida pela quarentena durante a pandemia de coronavírus, é a de que “aquela” reunião poderia mesmo ter sido um e-mail – e isso pode ser um aprendizado.
Há outras, porém, que continuam precisando ser reuniões. É essencial que o colaborador que atua remotamente continue integrado aos colegas, em sintonia com o time em suas atividades. Este é outro importante pilar de uma jornada flexível: a formação de squads ou grupos de atividades para que a realização de tarefas coletivamente. Mesmo em home office, duas cabeças continuam pensando melhor do que uma.
Ao implementar uma rotina com mais mobilidade, o gestor não pode deixar de pensar ainda em dois outros elementos: o engajamento e a produtividade. Longe, é mais difícil se manter envolvido com os valores da empresa e nem todo mundo produz bem estando em casa, mas nem uma coisa, nem outra, são impossíveis. É necessária uma mudança no mindset, repensar alguns processos e avaliar quais deles ainda fazem sentido dentro desta nova realidade.
Home office e qualidade de vida
Se o principal argumento a favor da flexibilização do trabalho é um ganho na qualidade de vida, essa prática não pode, em hipótese alguma, afetar negativamente o indivíduo no sentido contrário.
Trabalhar em casa não pode significar dar expediente de 24 horas. Internamente, cultivar uma cultura organizacional de atenção aos horários é uma maneira de garantir que nem gestores, nem funcionários, sejam cobrados cotidianamente para além do razoável.
O contato com clientes, fornecedores e parceiros deve seguir o mesmo raciocínio, mas é importante que a empresa colabore com a definição desses limites e parâmetros.
A palavra-chave é equilíbrio: reservar um espaço e definir um horário para trabalhar, delimitar bem a divisa entre os momentos em que se está trabalhando e aqueles em que se está focado em questões pessoais, para afastar a sensação de que o expediente nunca termina, são algumas estratégias comuns para tornar essa rotina mais eficiente neste sentido.
O resultado é mais produtividade e mais saúde: dados da global PGI mostraram que 82% dos trabalhadores com atividades remotas apresentam menores níveis de estresse, 69% menor absenteísmo – ou seja, mais engajamento – e 80% mais confiança, entusiasmo e autoestima.